segunda-feira, 26 de novembro de 2007

do contra

Minha vocação para ser do contra não tem limites.
Sexta-feira passada estive numa reunião promovida pela Divisão de Florestas e Estações Experimentais do Instituto Florestal do Estado de São Paulo, que reuniu gente graúda - "só diretoria", como costumam dizer os plebeus - que atua na gestão das reservas florestais do nosso Estado. Meu irmão também esteve lá, o secretário municipal do Meio Rural, o diretor da Casa da Agricultura Municipalizada de Itapetininga, além dos diretores das Estações Experimentais e Parques Ecológicos de Angatuba, Porto Ferreira, Avaré, Itararé, Itapeva, Bauru e professores da FAtec de Itapetininga - eu, entre eles.
O tema da reunião foi "ensino e pesquisa: uma parceria possível", cujo objetivo, pelo que entendi, é tornar essa entidade pública - o Instituto Florestal e seu considerável patrimônio ambiental - mais aberto aos estudos e pesquisas promovidas pelas faculdades. Daí a razão do convite à FATEC.
Bom, tudo ia bem até o momento em que fui convidado a me manifestar.
E o que que eu poderia falar? De ecologia, claro - pelo menos era o que eu achava o mais adequado para aquela reunião e aquele público.
E aí que depois de dizer que meu papel na Fatec é promover a formação de profissionais do Agronegócio que tenham uma visão "ecologicamente correta, socialmente justa e economicamente solidária" - meu chavão predileto desde que virei professor da FATEC -, eu acabei falando "mal" do Agronegócio, dizendo que esse termo, em plena era do aquecimento global, de eminente colapso ambiental, é um nome infeliz, pois carrega o peso da atitude capitalista para com a natureza, que transforma tudo em mero produto, comércio e lucro. E disse mais: que o mais adequado, já que não podemos fugir a uma sociedade regulada pelo comércio, é que o termo agronegócio seja trocado por alguma coisa como "agroECOnegócios", um termo que explicita melhor o imperativo ambiental sobre toda prática comercial agrícola.
Depois de falar, observei várias expressões de concordãncia com as minhas opiniões - o que não é de se estranhar, claro, pois acho que não falei nada além do óbvio e do que o bom senso dita.
Mas qual não foi minha surpresa quando uma pessoa dos presentes resolveu fazer uma fala retomando justamente essas minhas afirmações, fazendo uma espécie de censura, dizendo que o termo Agronegócio é sim um termo adequado e q não haveria necessidade de maiores preocupações nem maiores debates sobre o tema pois todo agronegócio hoje já pressupõe o respeito ao meio ambiente, ou pelo menos deveria pressupor.
Uauaauauau. Puxa, eu realmente não estava preparado para uma controvérsia.
Me senti na obrigação em reafirmar minhas idéias, não só por orgulho próprio, mas principalmente por acreditar que a ecologia deve ser o princípio de tudo, inclusive para os propósitos da reunião, que é o estabelecimento de parceria para pesquisa entre faculdade e Instituto Florestal, duas entidades públicas, mantidas pelo Governo do Estado de São Paulo.
Sou um cara educado, que não gosta de polemizar (por incrível que pareça!) .
Acabei dizendo que a questão ambiental é grave sim e que devemos ter cuidado com as palavras que usamos pois elas traduzem nossas concepções e atitudes. E que, se eu estava me referindo a necessidade de adotar uma nova palavra para designar o trabalho dos que vivem da produção e do comércio agrícola, era justamente para defender a necessidade de transformação dessas concepões e atitudes, que já se mostraram bastante negativas, conforme qualquer um pode comprovar bastando observar as mudanças climáticas que ocorrem ao longo de um dia qualquer de nossas vidas.
Acho que a pessoa não prestou muita importância para esse meu argumento (muito tosco, por sinal), e acabou encerrando a discussão contando uma espécie de "anedota", tipo: "quando a gente fala para uma criança do Paraná que vamos cortar uma árvore, ela fica feliz porque sabe que aquela árvore vai virar madeira para a sua carteira escolar ou para a sua cama. Mas aqui em São Paulo quando a gente fala a mesma coisa para uma criança, o que é que ela diz? Diz que vai procurar a Promotoria e denunciar para a imprensa o corte daquela árvore!"
Achei melhor ficar calado, embora constrangido.
Claro, eu é que não quero ser motivo para justificar qualquer desavença entre o Instituto Florestal e a Fatec (vixe, logo eu?!), e por isso achei melhor me dirigir pessoalmente, em reservado, ao final da reunião, para essa pessoa que sinceramente me pareceu ser realmente "do bem", apenas um pouco estressada e disse a ela qualquer coisa como: "olha, não quero que vc pense que sou ingênuo o bastante para tratar a questão ambiental como um mero problema de se cortar ou não uma árvore de calçada. E tb sei que o senhor tb não é ingênuo para acreditar que o agronegócio, tal como é desenvolvido no Brasil e no mundo, seja ele 100% respeitoso com o ambiente, se nem mesmo respeita os direitos trabalhistas dos bóias-frias".
"Ah, sim, é claro, é claro" ele resondeu. "Interpretei errado." Ok, sem problemas, eu respondi.
E assim foi...
E é isso aí. Eu consigo ser do contra até em reunião de diretores de reservas florestais.

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